Daniel Pinto

November 18, 2023

A cultura que afunda o barco

Entre outras coisas trabalho para a mesma empresa há quase 10 anos, éramos 2 no TI e fomos crescendo ao ponto de sermos mais de 70 agora.

Durante estes anos todos e talvez por falta de estar numa ambiente corporate ou por não ter maturidade suficiente, nunca liguei aos valores, à missão e à cultura da empresa, por muito que tentassem enfiar estes chavões na minha cabeça parece sempre que nunca me consegui relacionar com eles mas ao mesmo tempo tinha orgulho de trabalhar e de dizer “este mês já temos x clínicas” - estávamos todos a trabalhar para o mesmo objectivo.

Comprámos mais uma empresa gigantesca para se juntar a nós e uns foram embora e outros chegaram e a equipa foi crescendo. A liderança mudou, começou a crescer ao ponto que agora há mais gestão intermédia do que pessoal para fazer o trabalho.

Esses managers que entram porque já trabalharam com o diretor, trazem o pessoal com quem já trabalharam e deram cabo da equipa mais coesa que esta empresa tinha.

Discrepâncias salariais, benefícios, tratamento, responsabilidade - é só pensar e claramente se consegue ver quem veio já com uma oferta no bolso.

O ambiente está de cortar à faca e eu comecei a tentar tomar conta do pessoal à minha volta, a ajudar a encontrar outros empregos, formação, a fazer ver o que ainda havia de bom e o porque de ficar, mas eu também comecei a deixar de acreditar.

Uma reunião gigantesca aconteceu esta semana - o executivo todo presente a bajular-se num sem fim de elogios enquanto dizem que as coisas podiam estar melhores, que a economia está má, não dá para investir, não dá para aumentos, bónus, mas que cada vez mais as pessoas valorizam outras coisas sem ser o salário. Devem achar que estamos todos na Google ou que a malta que ganha mal que saber do café e dos outros “beneficios” como descontos em lojas de roupa, fds.. que coisa tão desligada da realidade. 

No final de tudo, Qual foi a solução encontrada? Arranjar um consultor para ajudar com a cultura da empresa 🙃

Foi aí que fiquei louco. Vídeos, posters, palestras e emails intermináveis a explicar os valores da empresa onde quase ninguém se revê, porque a realidade de quem está cá em baixo não é a mesma dos que estão lá em cima, liderar é uma coisa muito difícil de fazer e eles esquecem-se que tem tudo a ver com as pessoas. Mas é impossível mudar a mentalidade de 99% dos colegas - aquilo que tinha de ser feito seria tentar capturar aqueles que ainda acreditam e que querem fazer o esforço para ouvir mais e vender-lhes as ideias, o porquê, a direção. Quando os outros se sentirem de fora vão queres perceber e muito provavelmente vão seguir por exemplo, é isto que acontece normalmente.

Não vale a pena batalhar com quem não acredita - já está perdido mesmo antes de começar

Eu já estou na fase tóxica, onde comecei a deixar de acreditar, deixei de tentar ser o líder que os meus colegas sempre me disseram que fui e comecei a olhar para fora.

Vai ser difícil encontrar quem acredite que isto vai funcionar e vai ser ainda mais difícil conseguir fazer com que as pessoas que já cá andam há montes de anos se sintam bem porque o executivo está completamente desligado daquilo que se passa cá em baixo. Não querem saber do ambiente, das dúvidas da evolução - dizem que sim mas a realidade é bem diferente.

Um navio com um capitão desorientado é o mesmo que um navio a afundar - por isso, está na hora de saltar fora.

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About Daniel Pinto

O meu espaço pessoal onde falo sobre a minha jornada na liderança de segurança da informação e partilho insights do cruzamento entre tecnologia e segurança.


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