Guilherme Rey

April 30, 2024

Porque sim, Zequinha!



Você já deve ter ouvido falar das tais gerações X, Y, Z, etc. São como denominamos pessoas que nasceram e cresceram até os seus vinte e poucos anos em um mesmo intervalo de tempo. A geração Y, por exemplo, é composta por quem nasceu entre 1982 e 1994 - que é o meu caso. Uma característica interessante da nossa geração é que não nascemos imersos no mundo digital, tivemos a oportunidade de viver um pouco do mundo analógico. Quando eu tinha algum trabalho na escola, por exemplo, precisava buscar uma enciclopédia para me ajudar. A mais famosa era a Barsa, com seus (acho que) 16 volumes e milhares de verbetes. Depois de conseguir achar o volume com o verbete, nós ainda precisávamos estruturar o conhecimento e finalizar o trabalho escrevendo muito em folhas de papel almaço ou, se fosse um trabalho para apresentar, em folhas de cartolina - como faziam os Incas.

A televisão talvez fosse uma das coisas mais tecnológicas da época, mas ainda assim era analógica. Uma das emissoras mais famosas era a TV Cultura, que produzia diversos programas infantis muito bons, que hoje em dia são considerados clássicos. Um destes foi o “Castelo Rá-tim-bum”. Era sobre um menino de 300 anos que vivia com seu tio, um feiticeiro e cientista (Tio Victor) e com sua tia-avó Morgana, uma feiticeira de 6000 anos de idade. Nino estava sozinho no castelo - mesmo que tivesse lá algumas cias “sobrenaturais” - e resolveu usar um feitiço para tentar trazer amigos até ele, conseguindo três novos amigos. O programa era muito bem feito e trazia, além da história principal, pequenos quadros educativos de diversos temas. Um dos quadros que eu mais gostava começava quando um dos amigos do Nino, o Zequinha, perguntava “Por quê?” sem parar, até que todos os outros personagens chegassem no limite e falassem, juntos: “Porque sim, Zequinha!”. Isso dava abertura para que Marcelo Tas (sim, aquele que apresentava o CQC) entrasse com o clássico “Porque sim não é resposta!”. Em um dos episódios, Zequinha pergunta “Por que as flores são perfumadas?” e, depois de receber um sonoro “PORQUE SIM, ZEQUINHA” em uníssono, temos a explicação de como as flores usam o seu perfume para atrair as abelhas e ajudar na polinização. O ponto interessante sobre esse quadro era o fato de que a curiosidade do Zequinha era algo que acabava irritando os colegas, mas não deixava de ser reforçada positivamente pelo programa.

Não tão nostálgico quanto o Castelo Rá-tim-bum, mas olhando também para trás, me lembrei de um discurso do Steve Jobs, um dos maiores visionários da tecnologia que já tivemos, para a turma de 2005 de Stanford. Se você nunca assistiu, eu recomendo muito! Apesar da parte mais famosa ser o fim (“stay hungry, stay foolish”), ele também fala sobre quando havia acabado de desistir do curso normal da universidade e resolvido entrar em uma aula sobre tipografias, porque queria entender de onde vinham os cartazes tão bem feitos com tipografias tão impressionantes. Lá ele aprendeu tudo sobre tipografias, serif & sans serif, etc, mesmo sem nenhuma aplicação prática naquele momento, só pela vontade de querer aprender sobre o assunto. Dez anos depois, quando estava desenvolvendo o primeiro Mac, percebeu que tudo aquilo que havia aprendido sobre tipografias seria precioso - fez com que o Mac já surgisse com tipografias ótimas, algo que mudou a indústria. Segundo ele, “[…] muito do que eu acabei encontrando, seguindo minha curiosidade e intuição, acabou sendo impagável depois […]”.

Tanto o Castelo Rá-tim-bum quanto o Steve Jobs sabiam que a curiosidade é parte essencial do processo de aprendizagem. Em computação não é diferente. Em um dos livros de software que gosto muito, o Code Simplicity, Max Kanat-Alexander diz:


“The difference between a bad programmer and a good programmer is understanding.”


Mesmo que isso esteja no contexto de desenvolvimento de software, acho que acaba se aplicando a qualquer área. A diferença entre um profissional ruim e um profissional bom é o entendimento sobre o que se está fazendo. E a curiosidade é combustível para o entendimento. Devemos levar a curiosidade a sério, pois é o que nos ajuda a absorver conhecimento e posteriormente nos fará ter conexões que nem imaginamos serem possíveis. Se você é uma pessoa que precisa resolver problemas diariamente na sua profissão, para resolvê-los bem, precisa entendê-los bem. É preciso entender que saber fazer algo não necessariamente significa entender este algo. Claro que existe espaço para as duas coisas, e no começo sempre estamos mais para o lado de saber fazer sem entender, mas a busca pelo entendimento deve ser constante.

Mantenha sua curiosidade ativa o tempo inteiro! Nunca deixe que o seu aprendizado entre em modo automático, apenas para realizar alguma tarefa. Não podemos nos contentar com pouco, temos que ir atrás dos motivos, entender os conceitos, extrapolar o pensamento. Parafraseando Steve Jobs: Continue faminto, continue tolo, continue curioso.

Até a próxima!

About Guilherme Rey

Empreendedor, Professor e Cientista da Computação. Gosta de falar sobre tecnologia, pessoas e negócios.